Foi no fim de semana que tive que pousar o tabuleiro da comida , enroscar-me e no puff e já estava tão agoniada que tive que mudar de canal. Estavam a dar filmagens da guerra em Angola. Quase à nossa frente e quase em simultâneo os homens eram abatidos mas , mais frequentemente rebentados com minas. Os estilhaços deixaram-nos cegos, a outros incapacitados , a outros deficientes mentais. Outros viu-se práticamente em directo a ficarem sem pernas e braços, a berrarem e a pedirem para os matarem ali já, porque não queriam regressar assim para a família. E lá faziam uma pequenissíma tenda no meio do mato com um oleado em cima dos ramos de uma arbusto, enquanto os que estavam bem, salpicados de sangue cerravam a boca de raiva e medo e tinham que ouvir , presenciar o sofrimento do colega ali debaixo da tendinha. Depois davam depoimentos de homens que tinham combatido na guerra. Alguns, hoje, ainda choravam a recordar.
E eu lembrei-me de como ia crescendo com medo de perder o meu irmão, que o meu pai já estava safo, falava-se em ele ir para França, a minha mãe disse-lhe para se dar como objector de consciência pois não tinham dinheiro e, parece que seria isso que ia prevalecer. Um primo, o Vitor, um homem lindo, tinha perdido uma perna e um olho. Lembro-me vagamente quando ainda não fora de perigo tinha chegado de helicóptero ao hospital militar em Lisboa.
No Natal, eu não despegava da televisão a ver todos aqueles rapazes a dizerem uma mensagem às famílias. Não percebia bem aquele dramatismo mas ao chegar aos 12 anos, comecei a perceber que aquilo era a sério, mas não sabia mais nada.
Até que se deu o 25 de Abril.
Digam o que disserem do 25 de Abril, foi de facto uma das melhores coisas que aconteceu em Portugal.
Meu rico filho, criado para morrer, para matar, para sobreviver com aquelas lembranças.
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